Todos somos sabedores que, naquela região, se concentram as principais experiências de agroecologia e produção de alimentos da Agricultura Familiar Camponesa do nosso Estado. Essa realidade nos interpela para a consciência de se preservar o modo de viver destas comunidades, bem como a sadia qualidade de vida dessas famílias e do meio ambiente, sem interferir em suas práticas culturais e socioambientais.
Sabemos da grande importância do aproveitamento das águas da Barragem de Santa Cruz do Apodi, garantindo, em primeiro lugar, o abastecimento humano de todas as comunidades rurais e urbanas da região, como também na utilização para a produção de alimentos saudáveis, sem uso de agrotóxico, geração de emprego, renda, segurança e soberania alimentar para as famílias de agricultores/as familiares.
Após diálogo com as famílias na região, movimentos sociais, serviços e pastorais sociais da Igreja Católica, que há muitos anos atuam na Chapada do Apodi, compreendemos que a proposta de projeto defendida pelo DNCOS trará enormes prejuízos aos agricultores familiares ali residentes, pois terão de deixar suas casas e as terras, onde vivem há mais de um século, praticando agricultura baseada na agroecologia, para dar lugar a um grupo de empresas cujo modelo de produção baseia-se na monocultura e no uso intensivo de agrotóxico que, como sabemos, contamina a água, a terra e o ar, com consequências graves diretas na saúde das pessoas e no meio ambiente.
Lamentavelmente, ao alimentar esse padrão de desenvolvimento, o atual governo inviabiliza a justa prioridade que atribuiu ao combate à miséria em nosso país, tendo como eixo estruturante o crescimento econômico pela via da exportação de commodities. Esse padrão gera efeitos perversos que se alastram em cadeia sobre a nossa sociedade. Na Chapada do Apodi, a expressão mais visível da implantação dessa lógica econômica é a expropriação das populações de seus meios e modos de vida, acentuando os níveis de degradação ambiental, da pobreza e da contínua dependência desse importante segmento da sociedade potiguar às políticas sociais compensatórias.
Não temos dúvidas de que esse modelo, aqui adotado desde o início de nossa formação histórica, ganhou forte impulso nas últimas décadas com o alinhamento dos seguidos governos aos projetos expansivos do capital. Materialmente, ele se ancora na expansão do hidro agronegócio e em grandes projetos de infraestrutura implantados para favorecer a extração e o escoamento de riquezas naturais para os mercados globais.
A Igreja Católica, à luz de sua doutrina social, entende que a implantação de um projeto desta magnitude não pode ser motivada por uma lógica meramente econômica e produtivista, que não leva em consideração a proteção da vida humana e da sociobiodiversidade. Não temos o direito de subordinar a agenda do bem viver das comunidades campesinas à agenda econômica do modo de produção e consumo vigente.
Neste momento, como pastores do Povo de Deus, que está sob o nosso cuidado pastoral, somos chamados a ser solidários aos agricultores/as familiares da Chapada do Apodi e a sensibilizar o Governo Federal para REVOGAR o Decreto Nº 0-001 de 10 de Junho de 2011 e abrir diálogo na construção de novo projeto com os recursos já disponibilizados no PAC, que seja capaz de integrar a Chapada e Vale do Apodi visando fortalecer a agricultura familiar camponesa de base agroecologica, incluindo todos os assentamentos que estão nesta região.
Por fim, pedimos que Nossa Senhora da Apresentação, a Senhora Santana e Santa Luzia, padroeiras de nossas dioceses, intercedam junto a Deus para iluminar nossos governantes, para que promovam o bem comum, a paz e a justiça socioambiental.
Natal-RN, 05 de dezembro de 2011
Dom Matias Patrício de Macedo
Arcebispo Metropolitano de Natal
Dom Mariano Manzana
Bispo de Mossoró
Dom Manoel Delson Pedreira da Cruz
Bispo de Caicó
Dom Heitor de Araújo Sales
Arcebispo Emérito de Natal
Presidente do Seapac