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Reflexão para a Festa do Batismo do Senhor- Mateus 3,13-17 (Ano A)



Concluindo o tempo do natal, a Igreja celebra neste domingo a festa do batismo do Senhor. Por estarmos vivenciando o “ano A” do ciclo litúrgico, o evangelho proposto neste ano é Mt 3,13-17. O batismo de Jesus é o marco inaugural da sua vida pública, ou seja, do seu ministério. Porém, sua maior relevância não é cronológica, mas salvífica. Se trata de um evento programático, no qual são reveladas, antecipadamente, a identidade de Jesus e as principais coordenadas da sua missão. A nível de introdução e contexto, é importante recordar que o batismo é um dos eventos narrados pelos evangelhos que os estudiosos vêem com maior probabilidade de ter sido, realmente, um fato histórico da vida de Jesus. Contribui para essa visão o fato de ser um dos poucos acontecimentos presentes nos quatro evangelhos: explicitamente nos sinóticos (Mt 3,13-17; Mc 1,9-11; Lc 3,21-22) e implicitamente em João (1,19-34).

Além dessa pluralidade literária, o que mais tem contribuído para a aceitação do batismo de Jesus como um fato real são os problemas de interpretação deste evento desde as primeiras gerações cristãs. Ora, se não se tratasse de um fato histórico e importante da vida de Jesus, certamente os evangelistas o teriam omitido em seus escritos. Os principais problemas e questionamentos suscitados pela presença do batismo nos evangelhos, observados por teólogos e exegetas, inclusive, são os seguintes: sendo o batismo, sobretudo o de João, um rito de purificação destinado aos pecadores arrependidos, porque Jesus passou por esse rito se não era pecador? Supondo que o ministro do batismo tem autoridade sobre a pessoa batizada, porque Jesus aceitou ser batizado por João, se era superior a ele? Questões desse tipo surgiram muito cedo, inclusive na comunidade de Mateus. Por isso, entre as três versões do batismo nos sinóticos, a de Mateus é a mais rica; é a única que contém um diálogo entre João e Jesus, que funciona como resposta a questionamentos como aqueles recordados acima.

Olhemos para o texto, partindo o seu início: “Jesus veio da Galileia para o rio Jordão, a fim de se encontrar com João e ser batizado por ele” (v. 13). Essa informação é muito significativa, pois relata a primeira ação-movimento de Jesus no Evangelho de Mateus. Até então, no chamado “evangelho da infância” (Mt 1 – 2), Jesus não tinha feito nada por conta própria; todo o seu movimento fora conduzido por José e Maria, como na fuga para o Egito e o retorno à Galileia, para viver em Nazaré (cf. Mt 2,13-19). Aqui, ele está saindo da vida anônima, vivida supostamente em Nazaré, e começa a assumir um protagonismo. É relevante que o primeiro movimento de Jesus é em direção aos pecadores, pois eram esses que estavam sendo batizados por João, no Jordão (cf. Mt 3,6). A passagem dele pelo batismo é um pretexto para estar junto dos pecadores, antecipando quem serão os destinatários prediletos da sua missão: as pessoas pecadoras, pobres e marginalizadas da sociedade e da religião.

A atividade batizadora de João estava gozando de grande aceitação popular, atraindo pessoas de toda a Judeia, inclusive gente da cidade de Jerusalém, o centro do poder político e religioso (cf. Mt 3,5). A saída das pessoas de Jerusalém indo ao encontro de João para serem batizadas por ele, confessando os pecados (cf. Mt 3,6), é um verdadeiro atestado de falência da religião centralizada no Templo. Até mesmo fariseus e saduceus, membros dos grupos religiosos mais influentes da época buscavam o batismo de João (cf. Mt 3,7). De acordo com o evangelista, João tinha plena convicção da provisoriedade do seu batismo: era apenas um rito de purificação e um sinal de conversão (cf. Mt 3,11). Ora, João sabia que estava para vir o Messias, portador de um batismo definitivo no Espírito Santo e no fogo, quer dizer, com uma grande força transformadora, capaz de penetrar no íntimo da pessoa, o que as águas do rio Jordão não eram capazes.

O evangelista faz de tudo para deixar claro que Jesus não tinha necessidade de receber o batismo de João, mas o fez em solidariedade aos pecadores e em obediência ao projeto libertador do Pai. Inclusive, mostra que até mesmo João reconhecia isso: “Mas João protestou, dizendo: “Eu preciso ser batizado por ti, e tu vens a mim?” (v. 14). Mateus é o único evangelista que traz essa objeção de João, o que dá uma riqueza ímpar ao seu relato, certamente para responder às necessidades de sua comunidade e destacar a superioridade de Jesus em relação a João. De fato, esse protesto de João deixa ainda mais claro que Jesus não tinha necessidade do batismo, pois não havia pecado nele. Quis recebê-lo em solidariedade aos pecadores, deixando claro desde o início de seu ministério que toda a sua práxis seria direcionada especialmente às pessoas mais necessitadas.

À objeção de João, Jesus responde com uma síntese de todo o seu ministério: “Jesus, porém, respondeu-lhe: ‘Por enquanto deixa como está, porque nós devemos cumprir toda a justiça!’ E João concordou” (v. 15). Além do rico conteúdo, essa frase contém as primeiras palavras de Jesus no Evangelho de Mateus. E são palavras programáticas, bastante significativas, pois contém uma verdadeira síntese da sua missão: “cumprir toda a justiça”. O verbo “cumprir” e o substantivo “justiça” são duas palavras-chaves para Mateus e sua comunidade. Cumprir refere-se ao conjunto das Sagradas Escrituras judaicas (o Antigo Testamento) que encontra sua plenitude na vida e missão de Jesus. Da concepção até a paixão de Jesus, Mateus diz que as Escrituras se cumprem nele (cf. Mt 1,22; 2,15.17.23; 4,14; 5,17; 8,17; 12,17; 13,35; 21,4; 26,54.56; 27,9). Se trata de um dos verbos mais repetidos ao longo do Evangelho. Não significa a execução de ações, mas de levar o projeto libertador de Deus à plenitude. Em outras palavras, é fazer a vontade do Pai. Justiça é a conformidade à vontade de Deus; é todo o plano divino de salvação, compreendendo a predileção de Deus pelos pecadores, pobres e marginalizados. E João concordou com as palavras de Jesus, como deve concordar também a comunidade cristã em todos os tempos: é Jesus o cumpridor da justiça, por excelência.

Na continuidade, afirma o texto que “Depois de ser batizado, Jesus saiu logo da água. Então o céu se abriu e Jesus viu o Espírito de Deus, descendo como pomba e vindo pousar sobre ele” (v. 16). A abertura dos céus é uma imagem comum na literatura judaica bíblica e extra bíblica. Significa, antes de tudo, a disposição de Deus em se comunicar com a humanidade. Quando os tempos estavam muito difíceis, imaginava-se que Deus tinha fechado os céus e não mais se comunicava com a humanidade. Quando o profeta Isaías (Terceiro Isaías) se lamenta do julgo da dominação persa, após o exílio, expressa o desejo de ver “os céus se rasgando para Deus descer em socorro” (Is 63,19). A abertura do céu no evangelho de hoje, portanto, significa que em Jesus a comunicação entre Deus e a humanidade é restabelecida definitivamente. Já a imagem do Espírito de Deus descendo como uma pomba é uma novidade na linguagem bíblica, embora alguns estudiosos tenham tentado conciliar essa imagem com o “pairar” do Espírito de Deus sobre as águas no princípio da criação (cf. Gn 1,2), ou com a pomba que Noé soltou da arca durante o dilúvio (cf. Gn 8,8); essas interpretações, no entanto, já não são mais convincentes. O acontecimento é inovador em tudo, até mesmo na simbologia.

As imagens mais usadas para o Espírito de Deus na Bíblia são o fogo e o vento (cf. At 2,1-13). Porém, tanto o fogo quanto o vento, simbolizam o Espírito Santo pela força e capacidade de criação e transformação; em Jesus essas imagens não teriam sentido, pois o Espírito não desceu sobre ele para transformá-lo, mas apenas para confirmá-lo como o Filho amado do Pai, e para tornar pública essa confirmação. O Espírito preenche e transforma quem é carente dele; em quem já o possui em plenitude, como Jesus, apenas confirma. Desde a sua geração na eternidade e encarnação no ventre de Maria, Jesus já possuía o Espírito Santo em plenitude. A pomba evoca serenidade, tranquilidade, paz e consolo; não causa assombro algum; é esse o sentido da manifestação do Espírito com essa forma no batismo de Jesus: ele não foi transformado pelo Espírito naquele momento, porque já era fruto desse mesmo Espírito.

Mais importante que a imagem em si é a comunicação restabelecida entre a humanidade e Deus, não passando mais pela mediação das lideranças religiosas de Jerusalém, mas somente pela pessoa de Jesus. O céu se abre, Deus fala e afirma que o “seu bem-querer”, ou seja, a sua satisfação, não está nos inúmeros sacrifícios oferecidos no templo de Jerusalém, mas no seu Filho Amado. Mesmo com ecos antico-testamentários (cf. Is 42,1; Sl 2,7), a afirmação de Deus aqui é completamente nova de significado, superando todas as expectativas e promessas: E do céu veio uma voz que dizia: ‘Este é o meu Filho amado, no qual eu pus o meu agrado’” (v. 17). O messias que povo esperava era apenas um servo de Deus e filho de Davi, o que seria um mediador a mais. Deus envia o seu próprio Filho como único mediador. A voz que sai do céu significa Deus falando diretamente com a humanidade e que tem prazer por Jesus realizar a sua vontade; é isso o que significa pôr o agrado nele. Isso é realmente a inauguração de um novo tempo.

Que a recordação do batismo de Jesus reforce em nós a necessidade de estarmos em sintonia com o Pai, ouvindo a sua voz com sensibilidade aos impulsos do Espírito Santo que se manifesta nas diversas situações cotidianas. Que sejamos confirmados como filhos e filhas de Deus, em seu amor, para viver como irmãos e irmãs.

Pe. Francisco Cornelio F. Rodrigues – Diocese de Mossoró-RN

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